quinta-feira, 9 de julho de 2009

Das cinzas ao diamante

Eternizado em um diamante, o maestro repousa ao lado de suas partituras e livros.

Em 2004, a empresa suíça Algordanza ficou conhecida em todo o mundo por produzir diamantes unicamente a partir de cinzas humanas. A novidade causou curiosidade e a notícia se espalhou rapidamente. O processo, que utiliza tecnologia de ponta, é realizado por meio de compressão de moléculas de carbono, encontradas no corpo humano e, portanto, nas cinzas mortuárias. Ao contrário dos diamantes naturais, que são formados durante milhares de anos, os exemplares criados em laboratório levam algumas semanas para ficarem prontos. Os diamantes feitos pela Algordanza são certificados e, em sua grande parte, montados em joias.

Esta semana, o assunto voltou a ganhar destaque no noticiário. Um diamante foi encomendado por uma cliente de Curitiba, que resolveu transformar em pedra preciosa as cinzas do marido, um militar morto em 1994 e cremado no ano passado. A entrega foi anunciada para esta quarta-feira (9), pela Funerária Vaticano, representante da Algordanza na América Latina. A pedra tem 0,25 quilates e, segundo a empresa, seria o primeiro diamante feito com cinzas humanas do Brasil.

Mas o que pouca gente sabe é que já existe um diamante deste tipo, e bem maior, em São João del Rei, Minas Gerais. A pedra, de 0,5 ct e cor azul, foi produzida pela Algordanza com as cinzas do maestro Hans-Joachim Koellreutter, que morreu em setembro de 2005. Nascido na Alemanha, ele veio para o Brasil em 1937 e tornou-se um dos nomes mais influentes na vida musical do País. Cidadão honorário do Rio de Janeiro, passou os últimos anos de sua vida em São Paulo.

Além de regente, flautista e compositor, Koellreutter foi professor de Tom Zé, Tim Rescala, Paulo Moura, Isaac Karabtchevsky, Tom Jobim, Gilberto Gil e vários outros famosos. Tive a oportunidade de encontrar o maestro em várias ocasiões, em sua casa na cidade de Tiradentes (MG), e ouvir suas fascinantes histórias, como o relato de uma aula de harmonia em que pediu a Jobim que executasse um exercício ao piano e que deu origem à famosa canção "Samba de Uma Nota Só".


Foto: arquivo Joia brEm outubro de 2008, Koellreutter foi homeageado com a Ordem do Mérito Cultural, no Teatro Municipal do Rio de Janeiro. Margarita Schack, sua viúva, recebeu a condecoração e, discretamente, levou o diamante em uma caixinha dentro de sua bolsa. Ao final da cerimônia, ela mostrou a pedra a mim e a meu marido, e nos revelou que aquela gema azul brilhante era o nosso amigo maestro. Ficamos bastante surpresos, vocês podem imaginar! Margarita autorizou que publicássemos uma notinha na época, porém resolvi guardar as fotos e a história, até então...

Margarita nos contou que sua intenção não foi transformar o diamante em um pingente ou anel, longe disso. Ela fez uma doação à Fundação Koellreutter e, hoje, o diamante faz parte do acervo composto por correspondências, partituras, recortes de jornais e revistas e uma biblioteca com cerca de 800 volumes referentes à música européia e brasileira - materiais que abrangem as diferentes áreas de conhecimento do mestre.





N.E.: Hoje é possível também extrair carbono de fios de cabelo (e até de pelos de animais) para se produzir diamantes. Este processo já é realizado no Brasil (clique aqui e saiba mais)

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